A Reforma Tributária pretende ser um divisor de águas na história econômica do Brasil. Após décadas de debates, o país está finalmente implementando um novo modelo de tributação sobre o consumo, aposentando até 2032 os cansados ICMS, ISS, PIS,COFINS e IPI por novos impostos sobre valor adicionado (IVA). No centro dessa transformação estão a CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços), IBS (Imposto sobre Bens e Serviços) e o IS (Imposto Seletivo , conhecido imposto do pecado) — três tributos que prometem simplificar, unificar e tornar mais eficiente o caótico sistema atual. Ainda tem um resquício do IPI até 2073 para aqueles produtos que tenham produção na Zona Franca de Manaus , essa lista, disponível pela Suframa, e o tributo poderá se chamar IPI ZFM ?
Mas essa mudança vai muito além da troca de siglas. A transição para CBS, IBS e IS impacta diretamente a forma como as empresas compram , vendem, planejam e tomam decisões tributárias. Neste artigo, vamos mergulhar nesse tema, explicar o que é cada imposto, como será a transição, e o que muda na prática para empresas e consumidores.
Hoje, o Brasil convive com um modelo fragmentado e regressivo de impostos indiretos, que inclui tributos federais (PIS, Cofins, IPI), estaduais (ICMS) e municipais (ISS), cada um com regras próprias causando bitributação, guerra fiscal e alto custo de compliance. A autonomia dada pela constituição de 1988 aos entes da federação criou um dos mais complexos sistemas tributários do mundo.
Além disso, a complexidade do ICMS, da Substituição Tributária e do ISS compromete a competitividade tributária das empresas, dificultando o planejamento tributário e gerando distorções que penalizam a eficiência econômica. O contencioso tributário do Brasil é de 75% do valor do PIB sendo o principal ofensor a subjetividade e a interpretação da lei para assuntos como: a não cumulatividade, a materialidade ,substituição tributária e os incentivos fiscais.
Com a promulgação da Reforma Tributária, três novos protagonistas passaram a fazer parte do vocabulário de empresas, contadores e gestores fiscais em todo o país: CBS, IBS e IS. Mas afinal, o que significam essas siglas? De onde surgem? E, principalmente, quais tributos atuais eles vêm para substituir?
Essa mudança não é apenas uma troca de nomes — é uma reestruturação profunda na lógica de cobrança dos impostos indiretos, com impacto direto na carga tributária, no planejamento fiscal e na competitividade das empresas brasileiras. Entender a função de cada um desses novos tributos é o primeiro passo para se adaptar a esse novo cenário. Vamos aos detalhes.
A CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços) será o novo tributo de competência federal, proposto no contexto da Reforma Tributária para substituir o PIS e a Cofins, que hoje incidem sobre o faturamento das empresas, além de absorver parte do IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados). A outra parte do IPI será incorporada ao novo Imposto Seletivo, voltado à tributação de produtos com externalidades negativas, como bebidas alcoólicas, cigarro e combustíveis fósseis.
Confira a tabela comparativa entre PIS/Cofins x CBS, abaixo:
A CBS representa um avanço importante rumo a um modelo mais racional de tributação sobre o consumo, alinhando o Brasil às boas práticas internacionais por meio da adoção de um sistema inspirado no IVA moderno (Imposto sobre Valor Agregado).
1. Alíquota única e uniforme em todo o país
Diferente do PIS e da Cofins, que possuem diversas alíquotas e regimes diferenciados (como cumulativo e não cumulativo), a CBS terá uma única alíquota padrão, aplicada de forma uniforme a todas as operações com bens e serviços, independentemente do setor ou local. Isso traz mais simplicidade, isonomia e transparência tributária.
A alíquota ainda será definida por lei complementar, mas estimativas indicam um valor entre 8% e 12%, para manter a neutralidade da arrecadação.
2. Base ampla de incidência
A CBS incidirá sobre todas as operações com bens materiais e serviços, inclusive os digitais, o que representa uma expansão da base tributável. Plataformas de streaming, marketplaces e aplicativos de transporte, por exemplo, estarão plenamente sujeitos à nova tributação, algo que antes gerava debates e brechas legais.
3. Crédito financeiro integral (não cumulatividade plena)
Ao contrário da sistemática atual, a CBS adotará o modelo de crédito financeiro integral, que permite ao contribuinte apropriar-se de créditos sobre todos os insumos utilizados na atividade empresarial, independentemente da sua essencialidade. Essa regra elimina a subjetividade que existe na apuração de créditos de PIS/Cofins.
Isso significa que a não cumulatividade será plena e automática, sem necessidade de interpretação ou disputas administrativas sobre o que gera ou não direito a crédito — um dos maiores focos de litígios no modelo atual.
4. Substituição à cumulatividade e à complexidade atual
A CBS também extingue a lógica do regime cumulativo, que hoje ainda é aplicado a uma parte significativa das empresas, especialmente prestadores de serviços. Nesse regime, o imposto incide sobre o faturamento bruto, sem direito a crédito — o que gera distorções, eleva o custo da cadeia produtiva e prejudica empresas com baixa margem de lucro.
Ao adotar um modelo unificado e plenamente não cumulativo, a CBS busca corrigir essas distorções, incentivando a formalização, melhorando a eficiência econômica e reduzindo os efeitos em cascata dos impostos indiretos.
O IBS (Imposto sobre Bens e Serviços) será o principal tributo de incidência sobre consumo no âmbito estadual e municipal, surgindo da unificação do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços), que é estadual, com o ISS (Imposto sobre Serviços), de competência municipal. Ele representa um dos pilares mais transformadores da Reforma Tributária, pois consolida dois dos tributos mais complexos, litigiosos e heterogêneos do sistema atual em uma estrutura única e racionalizada.
O IBS será de competência compartilhada entre estados e municípios, algo inédito na estrutura federativa brasileira. Isso significa que, embora estados e municípios continuem sendo os beneficiários da arrecadação, o imposto será administrado de forma unificada por meio de um Comitê Gestor Nacional, com representação paritária entre os entes federativos.
Esse comitê terá como atribuições principais:
Esse modelo reduz significativamente a fragmentação normativa atual, em que cada estado define suas próprias regras de ICMS, e cada município pode legislar sobre o ISS de maneira independente. O resultado será maior previsibilidade, segurança jurídica e simplificação tributária.
Uma das maiores inovações do IBS é a adoção plena do princípio do destino. No modelo atual, especialmente no ICMS, a tributação se dá majoritariamente na origem — ou seja, no local onde o bem ou serviço é produzido ou vendido. Esse modelo criou distorções históricas no país, como:
Com o IBS, a lógica muda: a arrecadação será realizada no destino, ou seja, no local de consumo do bem ou serviço. Isso corrige a assimetria entre estados e desincentiva a guerra fiscal.
Embora o IBS seja um imposto nacional com administração unificada, a alíquota efetiva será composta por parcelas definidas separadamente por estados e municípios. Cada ente federativo continuará exercendo sua autonomia fiscal, podendo ajustar sua fatia da alíquota total — o que mantém o federalismo fiscal, mas dentro de um modelo mais coordenado.
Importante: apesar dessa autonomia, a base de cálculo, regras de crédito, prazos e obrigações acessórias serão padronizadas, o que reduz drasticamente a complexidade atual enfrentada pelas empresas que operam em múltiplas jurisdições.
O IBS terá profundas implicações na forma como as empresas lidam com seus projetos de expansão, definição de centros de distribuição e estratégias logísticas. Como a tributação será no destino e os créditos serão amplos e financeiros, deixará de fazer sentido escolher um estado ou município com base apenas em incentivos fiscais.
A tendência é que o planejamento tributário se torne mais estratégico e menos geográfico, priorizando ganhos de eficiência operacional e logística real. Isso tende a aumentar a eficiência alocativa da economia, com os investimentos sendo direcionados para onde realmente fazem mais sentido do ponto de vista de infraestrutura, mão de obra e mercado consumidor.
Um ponto sensível é o tratamento dos incentivos fiscais concedidos por estados e municípios, especialmente os benefícios de ICMS que ainda hoje influenciam a localização de indústrias e centros de distribuição. A Reforma preserva esses benefícios até 2032, como parte do período de transição, mas após esse prazo, novos incentivos ficam restritos e sujeitos a regras mais rígidas e transparentes.
Isso exige que empresas com projetos de longo prazo reavaliem suas estratégias locacionais, pois o novo modelo impõe uma transparência fiscal maior e uma menor margem para disputas regionais.
Para melhor compreensão, confira a tabela abaixo, com o comparativo das mudanças entre ICMS + ISS x IBS:
O IS (Imposto Seletivo) é o terceiro pilar da nova estrutura tributária sobre consumo. Popularmente conhecido como o “imposto do pecado”, o IS será aplicado a produtos e serviços que geram externalidades negativas à sociedade e ao meio ambiente. Seu objetivo não é arrecadatório primário, mas sim regulatório: desestimular o consumo de itens considerados prejudiciais.
Entre os produtos que devem ser tributados pelo IS, estão:
O IS substituirá parte do atual IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados), que será extinto gradualmente, exceto em relação a alguns produtos da Zona Franca de Manaus. Neste caso, a Constituição prevê a manutenção de um “IPI ZFM” até 2073, garantindo competitividade à região.
Empresas que atuam nos setores impactados pelo IS — como bebidas, tabaco, combustíveis, refrigerantes e alimentos processados — precisarão reavaliar sua política de preços, margens e posicionamento de mercado. O IS pode representar um aumento significativo na carga tributária desses produtos, exigindo ajustes estratégicos e operacionais.